Já leu o livro “A sociedade do cansaço”? Eu gostei muito. Fala sobre os efeitos colaterais dos discursos motivacionais e o excesso de positividade que a sociedade impõe. Encontre um objetivo, seja forte, trace metas, não olhe para os lados, trabalhe, produza… Uma sociedade esgotada.
Eu fiz parte disso e cheguei a sentir muito orgulho.
Quem não está mais ou nunca esteve nesse ciclo de alta performance pode inclusive se imaginar incapaz, mas não é. Todos nós temos um tempo particular e o que precisamos com a máxima urgência é nos respeitar.
Desse modo gostaria de deixar claro aqui que o objetivo desse blog não é e nunca será o de mostrar como basta ter foco e objetivo para alcançarmos o sucesso, pois nós sabemos(eu senti na pele) que não temos o controle sobre tudo nessa vida.
Então esse espaço aqui é uma catarse onde eu decidi após pouco mais de 10 anos, conversar com desconhecidos sobre as minhas vivências, as minhas dores mais profundas, os meus fracassos e a tentativa de me manter firme para continuar mesmo não tendo mais objetivo nenhum, além de informar sempre que possível sobre algo que eu tenha algum conhecimento e que tenha me ajudado ao longo dessa trajetória.
Movimento
O fato é que após pouco mais de 10 anos da minha grande queda eu comecei a sentir um certo incômodo. Comecei a sentir alguma inspiração, ainda que leve, para me mover mesmo sem direção. O golpe que vivi foi tão grande que para mim era necessário um momento de inércia, mas eu precisava sobreviver dentro dessa inércia e foi o que eu fiz. É o que eu faço.
Eu não sou religiosa, não tenho costume de fazer orações ou rezar, mas muitas vezes peço socorro ao que acredito ser superior. Contudo, ultimamente, tenho agradecido também, coisa que não fazia. Mesmo ainda sendo uma revoltada com o que a vida me proporcionou, tenho me deparado com várias situações onde preciso muito agradecer.
Acredito que as dores são incomparáveis porque seres humanos são únicos e não podemos de maneira nenhuma diminuir o sofrimento de alguém por existir no mundo outra pessoa sofrendo mais.
“Se eu consegui você também consegue” jamais será dito por aqui até porque eu não consegui absolutamente nada do que eu queria, mas acredito que devo agradecer por ter tido oportunidades, relativo apoio quando precisei e acesso à informação.
Já pensou se não tivesse tido condições de ir para a minha médica assim que retornei? Se não tivesse a casa dos meus pais para voltar? Imagina ter que permanecer naquela relação por não ter para onde fugir? E eu sei que essa é a realidade de muitas pessoas.
Missão
Penso que temos algo a fazer por aqui e eu ainda não sei qual é a minha missão, mas estou tentando ficar em alerta para descobrir.
A verdade é que mesmo sendo uma geminiana desvairada que se atira em qualquer situação da vida sem pensar no amanhã, eu sempre tive planejamentos e objetivos. Eu queria uma vida estabilizada e uma família. Trabalhei fortemente para alcançar esse objetivo e a produção da vida simplesmente me disse que NÃO!
Eu não teria o que eu queria e muito menos da forma que eu havia sonhado e planejado.
Com pouco mais de 30 anos, com uma vida estável e uma carreira decolando, eu havia acabado de “cair do cavalo”.
Perdi tudo incluindo o sonho de engravidar e ser mãe. Aliás, uma das minhas maiores frustrações é não ser mãe.
Claro, é possível adotar uma criança, mas seria um egoísmo tremendo fazer isso agora. Não tenho emocional para isso. Ainda sou amargurada e frustrada e não tenho mais a tolerância que é preciso ter para educar uma criança.
Além disso, essa criança correria um sério risco de passar a ser a responsável pela minha felicidade. Isso não se faz. Aliás, assuntos relacionados às crianças me abalam muito. Sempre choro escondido. Não é fácil.
Caminhando sem objetivos e metas
É possível caminhar sem sonhos e sem objetivos? Eu sou prova viva de que sim.
Eu ando mais por causa disso? É claro que sim. É real que quem não sabe para onde quer ir, caminha muito mais e atualmente não vejo problema algum nisso. Cada coisa tem o seu tempo. Eu aprendi.
Entretanto falar que uma pessoa sem metas não chegará a lugar nenhum não é verdade. Em algum lugar eu sei que vou chegar, só não sei qual. E a essa altura não estou muito interessada em saber. Estou mais preocupada em cuidar da minha paz durante esse caminhar despretensioso que agora faz parte de mim..
Essa é a minha única certeza e talvez seja até um objetivo que ainda não soube qualificar. Talvez essa calma de hoje tivesse me salvado do meu passado, mas eu preciso viver em paz comigo e com a minha história. Eu preciso parar de me culpar tanto.
Sentir tristeza é natural
Hoje, lembrando do início do meu percurso para tentar sobreviver, percebo que inconscientemente estipulei pequenas metas.
A minha realidade passou a ser outra. Eu tinha uma doença agindo em meu corpo que eu precisava descobrir o que era para tratar, tinha mais de 100 mil reais em dívidas, além de contas em bancos bloqueadas e uma cobrança judicial. Foi como descer vários degraus de uma escada e não ter mais como subir.
Passavam inúmeros pensamentos terríveis em minha mente sobre mim e contra mim, mas eu não considero covardia e falta fé como muitas pessoas costumam afirmar. Sentir tristeza é natural. Pensamentos negativos quando estamos tristes também é natural.
Eu estava depressiva e tomada por um sentimento de razão e consciência de que a minha vida e o meu futuro estava em risco. Quem permanece calmo com isso?
Tenho profundo respeito por quem está tomado de razão sobre a realidade e tomado também de sensibilidade. São duas sensações que esgotam qualquer mente quando estão juntas, mas o importante é buscar apoio de um profissional ou até de pessoas que nos amam de verdade.
Acredito que é preciso ser um pouco irracional e distraído para aguentar esse plano, concorda? Falo agora em termos gerais.
Quem consegue sair para comprar pão ou ir à praia naturalmente se não tiver momentos de devaneios para esquecer do que acontece à nossa volta?
Sem objetivos, metas ou sonhos eu estou aqui com dias de muitas lágrimas intercalados com dias de muitos risos. Sem cobranças, atenta com os meus limites e sobretudo me respeitando muito.
Espero que, distraída e sem pressa, consiga chegar em algum lugar interessante e que eu esteja acompanhada pela paz interior de que eu tanto preciso.